Alerta: sinal vermelho no Guandu
Água quase intratável eleva custos da estação de tratamento em R$ 5
milhões por ano
A CEDAE gasta em média
318 toneladas de produtos químicos (cerca 250 toneladas de sulfato de alumínio,
18 toneladas de cloro, 30 a 40 toneladas de cal, 10 toneladas de fluor), além
de 100 quilos de polímeros por dia, apenas para tratar a água captada pelo
Sistema Guandu nas bacias hidrográficas dos rios Guandu e Paraíba do Sul. Esta
quantidade poderia ser reduzida em cerca de 20 a 25%, não fosse o excesso de
poluição encontrada naqueles corpos hídricos – que representam a única fonte de
abastecimento da Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
Segundo o diretor de
Produção e Tratamento da CEDAE, Flávio Guedes, a péssima qualidade da água
obriga a estatal a investir recursos adicionais da ordem de R$ 5 milhões/ano
para garantir a qualidade da água que abastece a Região Metropolitana do
Estado: “Esse dinheiro poderia ser aplicados na melhoria do sistema de
abastecimento ou da própria Estação. Somente com produtos químicos, a ETA gasta
por ano cerca de R$ 18 a R$ 20 milhões no tratamento da água”- explicou.
Flávio Guedes, que há
anos vem alertando para a gravidade do problema, lembrou, mais uma vez, que,
sem essas fontes de abastecimento, a sobrevivência da Região Metropolitana do
Rio de Janeiro, que depende em 80% delas, está ameaçada.
“Há poucos anos, em
1994, a ETA não dispunha de grandes tecnologias, operava quase manualmente,
apenas com o conhecimento e experiência dos técnicos. Em 1995, sentimos
necessidade de monitorar melhor a estação, para fazer frente à queda da
qualidade da água e instalamos um Centro de Controle Operacional (CCO), com
capacidade para monitorar 86 pontos dentro da ETA. Em 1997, tivemos que fazer
um novo, diante do desafio de tratar a água, com capacidade para 900 pontos em
todo o complexo do Guandu. Agora, vamos inaugurar, um outro ainda mais moderno,
além do novo laboratório, que já está funcionando, para que possamos acompanhar
e controlar o processo unitário de tratamento. Isto porque apenas a mão humana
já não resolve mais, frente às absurdas e grotescas mudanças que estão
ocorrendo nos parâmetros de tratamento”, explicou.
O diretor da CEDAE
garantiu que, atualmente, todos os pontos do Guandu estão sendo controlados e
alguns mais importantes estão automatizados. “Tudo isso é um fenômeno de causa
e Efeito. A Causa é o que estamos fazendo com o rio e o efeito é o que está
acontecendo com a Estação. Isto porque, a ETA está preparada para quase tudo, mas
não para tratar uma água fora dos padrões de tratabilidade”, alertou.
Problema anunciado
“A crise que o
sistema de tratamento do Guandu enfrentou é um problema anunciado. A gente vem
alertando já há algum tempo, junto com a ASEAC, sobre o perigo da degradação
ambiental das bacias do Paraíba e do Guandu: crescimento desordenado;
tratamento de esgotos industriais, ao meu ver, inadequado; retirada de areia
descabida; destruição das matas ciliares; e despejo irregular de resíduos
sólidos (lixo) e esgotos domésticos”, desabafou Flávio Guedes.
Segundo ele, o que
ocorreu nesse episódio recente foi a coincidência de uma seca muito prolongada
(cerca de seis meses), seguida de chuvas fortes no final da temporada. “Foi a
maior seca da história: a vazão normal das linhas pretas (Sistema Acari) caiu
dos seus 3,2 a 4 mil litros/Seg. para 1800 litros/Seg.”, explicou. Quando as
chuvas vieram, carrearam para o leito do rio todo o volume de dejetos
acumulados na bacia dos municípios de Nova Iguaçu, Paracambi, Queimados, Seropédica
e Miguel Pereira, devido a queda de vazão do rio. Esses detritos foram parar na
ETA. E a quantidade absurda de matéria orgânica prejudicou a operação da
Estação. É muito difícil tirar tanta matéria orgânica solúvel da água - cor –
pelo processo convencional de tratamento. Mesmo conseguindo uma clarificação
excelente, passa uma quantidade muito grande de matéria orgânica, provocando um
cheiro característico, que muita gente acabou confundindo com pesticidas,
detergentes etc.”, explicou Guedes.
A solução, de acordo
com o diretor da CEDAE, foi reduzir a vazão da ETA para aumentar o tempo de
retenção da água na Estação, melhorando, assim, o processo de tratamento. Para
ele, todo o problema era previsível e os técnicos já vinham alertando para essa
possibilidade. Para agravar a situação, essa água foi para a tubulação e, com a
redução da vazão da estação, ficou confinada nela (são cerca de 14 milhões de
metros no Grande Rio), sem poder liberar aquela água com odor característico,
decorrente dos gases gerados. “Como a produção de água foi reduzida, não
pudemos empurrar aquela água, o que fez com que o odor persistisse por mais
tempo. Mas em momento algum a água ficou fora dos padrões. Nós fizemos várias
medições na água bruta e não achamos organoclorados em quantidades que pudessem
comprometer a saúde (o máximo permitido é de 100 microgramas por litro). E
diversos laboratórios de renome analisaram a água e também não encontraram”,
explicou.
Tomando o testemunho
do superintendente do Guandu, Dirceu Mafaldo, que atua na estação desde a sua
inauguração, há 46 anos, Flávio Guedes garantiu que a ETA nunca viveu uma
situação como esta recente. “Por isso, lastimei muito que a FEEMA tenha
divulgado informações totalmente descabidas, quadradas e tortas, afirmando que tinham
encontrado algas cianofíceas anabaena na água tratada. Um laudo totalmente
equivocado, já que não se pode encontrar algas na água tratada, mas sim suas
toxinas, que, mesmo assim, eram em quantidades mínimas, sem qualquer ameaça à
saúde”, desabafou o diretor.
Flávio Guedes lembrou
ainda que ele próprio, no auge da crise, fez questão de avisar à população que
estava aumentando em 20% as quantidade de cloro na água para melhorar o
processo de oxidação, devido ao aumento da carga orgânica, o que não significa
aumentar o residual de cloro na água. “Alguns sanitaristas de plantão se
aproveitaram disso para tirar proveito pessoal na imprensa”. Primeiro, a gente
não joga cloro na água, nós dosamos; depois – seja cloro, sulfato ou cal – tudo
é testado e medido antes, através de sistemas informatizados, para garantir as
quantidades certas”, explicou.
Um alerta geral
O diretor da CEDAE lamentou o problema ocorrido na ETA, mas
considerou positivo, no sentido de alertar à sociedade para a situação da bacia
do Guandu. Disse ainda que a ASEAC é um instrumento valioso no processo de
esclarecimento. Principalmente quanto ao fato de que a CEDAE não fabrica água.
Ela pega na natureza e trata.
- Eu faço um alerta,
não como engenheiro, mas como pai, preocupado com as gerações futuras: A maior
estação de tratamento do planeta – a natureza, que comanda o ciclo da água – já
está apresentando deficiências em função dos gases dispersos na atmosfera.
Hoje, já temos chuva ácida, por exemplo. É hora de todos os sanitaristas e
ambientalistas da CEDAE entenderem que o problema não é somente da Empresa, é
de toda a sociedade; não é somente dos municípios que integram a bacia do
Guandu, mas também daqueles localizados na Região Metropolitana e do próprio
Rio de Janeiro, que se farta dessa água”.
Flávio Guedes
defendeu o desvio imediato do rio dos Poços – que recebe uma carga imensa de
poluentes - para mudar o ponto onde ele deságua, próximo à captação de água da
Estação do Guandu, para outro, à jusante, porque hoje 100% dele vão para dentro
da ETA. “Estamos estudando a implantação de um sistema de pré-óxidação da água,
que poderá ser através de raios ultravioleta, ozônio ou permanganato. A água
captada pelo Sistema Guandu ainda está dentro dos padrões de tratabilidade, mas
não sei por quanto tempo vai aguentar. Eu acredito que a gente não tenha mais
muito tempo”, advertiu.
Antes de concluir
Flávio Guedes insistiu na necessidade urgente de se resgatar o poder de
depuração do rio Guandu. “É como um organismo humano. Se ralamos o braço, a
ferida acaba cicatrizando sozinha. Com o rio é a mesma coisa, mas o poder de
depuração do Guandu está no fim. O rio está todo machucado, e nós estamos
tirando sangue dele, arrancando seus braços e suas pernas . Precisamos devolver
o seu poder de se curar. O rio está doente e mesmo assim a gente quer que ele
trabalhe mais, que não coma bem, se esforce acima do que pode, até morrer”.
O diretor da CEDAE - funcionário de carreira da Companhia - se mostrou
aliviado pelo fato de a CEDAE permaner sob gestão pública. “Hoje, somos
extremamente dependentes do Guandu, mas graças a Deus, com uma companhia
estatal voltada para a saúde. Se não tivéssemos vencido a batalha contra a
privatização no governo Marcello Alencar, não sei o que poderia ter
acontecido”, indagou. Para ele, se a CEDAE estivesse entregue a uma
multinacional que visasse apenas o lucro, dificilmente teriam deixado de
faturar os nove bilhões de litros de água que o Guandu abriu mão quando decidiu
reduzir a vazão à metade para garantir a qualidade da água e preservar a saúde
da população”, concluiu.
Guandu – Fundado em 1955. Alimentado pela
transposição das águas do Paraíba do Sul para o rio Guandu, abastece 80% da
Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Caminha para a intratabilidade.
Imunana Laranjal – Fundado em 1952.
Alimentado pelas águas dos rios Macacu e Guapiaçu, abastece os municípios de
Niterói, São Gonçalo e Itaboraí. Os dois rios caminham para a extinção.
Sistemas Extintos devido à degradação:
Santos Malheiros – Fundado em 1927 –
Desativado. Tratava água do rio Guandu Mirim. Deixou de ser utilizada como
Estação de Tratamento, devido à contaminação da água do rio.
ETA Caxias – Fundada em 1946 – Desativada na
década de 70. Tratava água do rio Botas. Deixou de ser utilizada como Estação
de Tratamento, devido à contaminação do rio, que deixou a água sem condições de
tratamento.
Indústrias potencialmente perigosas instaladas nas bacias do
Paraíba e do Guandu:
BACIA DO PARAÍBA DO SUL
Total de indústrias – 700
Potencialmente perigosas - 47
Principais indústrias da Bacia do Paraíba:
ITATIAIA
Xerox – Solventes - acaba de ser vendida
Michelin – Pneus
Clariant – Inseticidas
Norvartis – agrotóxicos
e alvejantes – comprou a antiga Sandoz
Cianamid – Produtos químicos
e agrotóxicos
Dupont – agrotóxicos
RESENDE
Volkswagen – Veículos
Automotores
Peugeot - Veículos
automotores
GalvaSud – Mecânica
BARRA MANSA
Siderúrgica Barra Mansa – Vergalhões
Metalúrgica Barbará – Tubos de ferro fundido
CSN – Siderurgia
Cia. De Papel Piraí - Papel
Bacia do Guandu
Total de Indústrias – 26
Principais indústrias (Codin)
Kaiser
Citycol
Ideal Standard
Centralli Refrigerantes