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Com uma manobra de fazer inveja a seu antecessor Marcello Alencar, o governador do Estado, Anthony Garotinho, conseguiu esvaziar, no fim de agosto, a ação da população em dois eventos que poderiam mudar o rumo das privatizações no Rio: a Audiência Pública realizada no Riocentro para discutir a privatização do Saneamento na Barra, Recreio e Jacarepaguá e a reunião da Asep, para debater o retorno da conversão do gás manufaturado para o gás natural pela CEG privatizada.

"Farinha do mesmo saco". Esta foi a classificação que os empregados da Cedae e os representantes da sociedade civil deram para a postura do governador Anthony Garotinho em relação a seu antecessor, Marcello Alencar, depois de serem espancados por cerca de 100 soldados da Polícia Militar e da guarda municipal do prefeito Luiz Paulo Conde, durante a Audiência Pública realizada no Riocentro no dia 30 de agosto para discutir o edital de privatização nos três bairros da Zona Oeste.

A estratégia de Garotinho foi a mesma usada por seu mestre - o ex-governador Marcello Alencar - no início de 1998. Numa sexta-feira, véspera do carnaval, sob forte aparato policial, Marcello Alencar, para impedir a participação democrática da população na Audiência Pública realizada nas dependências do Palácio Guanabara, através da qual o governo tentava privatizar a CEDAE, sob protestos generalizados da sociedade.

Nos dois episódios, a população interessada foi literalmente impedida de participar dos debates, cinicamente batizados de Audiência Pública. A única diferença foi que, na época de Marcello, a população não passou sequer dos "portões do palácio". Desta vez, para tentar disfarçar a censura, os organizadores limitaram a participação em 400 pessoas, num local que dispõe de um auditório para cerca de 3 mil pessoas. A estratégia foi simples com a clara intenção de impedir o debate, uma vez que a sociedade, escaldada com a péssima qualidade da CEG, Light, CERJ e outros serviços públicos privatizados, não admite falar em privatizar um serviço essencial como o Saneamento Básico.

Vergonha

Além de marcar em horários conflitantes dois encontros de interesse dos consumidores - a Audiência Pública no Riocentro e a reunião da Asep para decidir o retorno da conversão do gás - o governo do Estado deixou de fora do auditório mais de 100 pessoas que foram orientadas a só assistir a reunião através de um "telão", e não participar da Audiência. Irritadas com o comportamento antidemocrático do Executivo, representantes da população e empregados da Cedae, apoiados por alguns políticos presentes, iniciaram um protesto exigindo a liberação do acesso ao auditório para todos ou a suspensão da Audiência.

Armado o conflito, nenhuma autoridade presente tentou uma conciliação. Pelo contrário, a impressão foi a de que o objetivo era aquele mesmo: promover uma grande pancadaria. Uma demonstração clara do que o governador Anthony Garotinho entende por democracia. E, é claro, um alerta para todos nós do que poderá ocorrer se Garotinho, eleito governador pelo voto direto, viesse a ser presidente da República, como ele sonha que será.

Minutos antes da pancadaria generalizada, parlamentares, entre os quais o deputado Carlos Minc, o vereador Eliomar Coelho, o deputado Vivaldo Barbosa e o candidato a vereador Lindeberg Farias, ainda tentaram argumentar com o Secretário de Saneamento e Recursos Hídricos, Luiz Henrique Lima, mas este ignorou qualquer argumento, se preocupando apenas em chamar o comandante do policiamento e mandar formar um cordão de isolamento à frente da mesa.

A partir daquele momento, qualquer possibilidade de diálogo foi interrompida e, 45 minutos depois de iniciada, a Audiência se transformou numa confusão generalizada. Ostentando notas de um real e atirando-as sobre os representantes dos governos estadual e municipal, os manifestantes gritavam palavras de ordem e ofereciam dinheiro aos componentes da mesa.

"Não, não, não à privatização; vender a Cedae, é coisa de ladrão!!!" - gritavam os manifestantes ao mesmo tempo em que pediam a suspensão da Audiência e acusavam o presidente da Cedae, Alberto Gomes, de traidor, "judas", apelando à memória de seu pai - engenheiro de carreira da Companhia - e acenavam com notas de Real. "É dinheiro que vocês querem?", perguntavam, diante do olhar impassível de Alberto Gomes, também funcionário de carreira da Companhia, mas também representante do governo do Estado na comissão mista formada com a prefeitura para viabilizar a privatização dos serviços na Barra, Recreio e Jacarepaguá.

No meio do protesto, surgiram duas faixas contra a privatização da Cedae. Às 20h15, abriram-se os portões laterais do auditório e um novo contingente de policiais do Batalhão de Choque da PM invadiu o auditório, assustando os presentes. Mas não houve mais tumulto: era apenas a "deixa" que o secretário de Saneamento aguardava para encerrar a Audiência Pública e deixar o recinto junto com os demais membros da mesa e empresários presentes.




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